sexta-feira, 12 de junho de 2009

Sombras na multidão

Ravena Brazil

As gotas de chuva caem como pedras atiradas ao chão. O vento passeia com um barulho constante e ensurdecedor. O frio toma conta de tudo e de todos. Três pessoas deitadas como sombras em frente a uma loja de departamento em colchões sujos envoltas em panos para amenizar o frio.

Cena normal em uma cidade em “crescimento” como Guarapari, que geralmente passa despercebida aos nossos olhos. Seria mais um dia onde uma forte tempestade ocupara o fim da tarde, não fosse por um pequeno detalhe que me deixa estática por alguns segundos. Deitado ao lado de uma das pessoas havia um cachorro vestindo uma fina roupa feita com um saco plástico de lixo. Fiel e imóvel junto ao seu dono. Parei e por alguns segundos contemplei o cuidado daquela pessoa com seu melhor amigo, em ter a consciência de que ele precisava ser aquecido e ter um lugar para dormir. Continuei então caminhando rumo à minha casa onde havia uma cama quentinha me esperando e lugar adequado para os meus cães, inclusive alimento em fartura – Graças à Deus. Aquela cena jamais saiu de minha memória.

De acordo com a Wikipédia, o sociólogo francês Robert Castel (1990), definiu a exclusão social como o ponto máximo atingível no decurso da marginalização, sendo este, um processo no qual o indivíduo se vai progressivamente afastando da sociedade através de rupturas consecutivas com a mesma.

Estranho é como em uma cidade em constante “crescimento” podemos ver tantas pessoas nesse nível de marginalização. Estranho é como passamos por essas pessoas várias vezes ao dia, várias vezes em nossas vidas e não falamos sequer um “bom dia, como vai?”. É como se eles não existissem, são sombras na multidão.

Estranho é como nos conformamos em ver seres humanos e até mesmo animais em situações como essa e não fazemos nada, aliás, nada seria bom, não suficiente, mas bom. Isso porque muitos passam por um cão abandonado na rua e chutam, muitos jogam os filhotinhos de gato no rio. Aquela pessoa, que não tinha sequer um abrigo e que provavelmente não sabe se vai ter o que comer amanhã, se preocupou com a vida de seu fiel amigo.

Os moradores de rua estão à mercê de nosso pré-julgamento, porque raramente procuramos saber os motivos que os levaram até o fundo do poço e não temos coragem de estender a mão ao próximo – às vezes por egoísmo, às vezes por descuido. A atitude daquele homem nos fez ver que existe vida ali, existe amor ao próximo, existe necessidade de socorro e existe um lado bom num mundo que para muitos parece perdido.

Ravena Brazil Vinter

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